Crônicas de conteúdo histórico-cultural sobre artistas, personalidades, políticos e acontecimentos em Duque de Caxias, RJ, projeto concebido pelos jornalistas Alberto Marques e Josué Cardoso.

quinta-feira, outubro 20, 2005

A OUSADIA DE UM HOMEM MUDOU A HISTÓRIA DE CAXIAS (Coluna 144, Parte 1)


Até 6 de outubro de 1930, a primeira estação ferroviária, após a transposição do rio que separava o Distrito Federal do antigo Estado do Rio de Janeiro, tinha o nome de Meriti, devido à abundância desse tipo de palmeiras na região, que acabara sendo utilizado para batizar também o rio que nasce no sopé da Serra de Gericinó e deságua na Baia de Guanabara. O nome da estação ferroviária era motivo de chacota dos moradores e da imprensa carioca, que chamava o lugarejo de "Meriti do Pavor", pois a região era uma sucessão de brejos, onde proliferavam a malária e onde faltava tudo. Certa vez, de passagem pelo local rumo a Petrópolis, o Presidente Nilo Peçanha ficara chocado com a correria de mulheres e crianças em direção ao "suspiro" na locomotiva, onde tentavam aproveitar o excesso de vapor transformando-o em água potável. Ao saber que o local não dispunha de água potável, Nilo Peçanha determinara que fosse construído um ramal, a partir da rede de água que abastecia Vigário Geral, instalando duas bicas próximas à estação ferroviária, sendo uma na esquina da Rua Joaquim Lopes de Macedo com Avenida Plínio Casado, e uma segunda, na esquina da Rua Pinto Soares com a então Estrada Rio-Petrópolis.
Com a chegada da água e algumas obras de saneamento, inclusive o calçamento de algumas ruas e a instalação de um posto dos correios e telégrafos, que melhoraram as condições de vida da população, o apelido de "Meriti do Pavor" passou a incomodar. Foi então que um morador do local, José Luis Machado, que todos tratavam como Machadinho, teve a idéia de substituir a placa da estação ferroviária, mudando o nome do local. Com o apoio dos moradores, o nome escolhido foi "Caxias", uma homenagem a Luis Alves de Lima e Silva, o general vitorioso na guerra contra o ditador paraguaio Solano Lopes e responsável pela pacificação do País em torno do Império. Assim, no dia 6 de outubro de 1930 e numa ação espontânea, o povo acompanhou Machadinho numa invasão à estação ferroviária, onde a placa indicativa de Estação Meriti foi substituída por outra, onde fora pintado apenas "Caxias". Para cometer esse arroubo, Machadinho teve o apoio de Jaime Fischer Gamboa, Oswaldo Gamboa, Américo Soares e Francisco Azevedo, os únicos no grupo que estavam armados e que não enfrentaram qualquer tipo de reação dos funcionários da estação ferroviária.
Segundo uma alentada reportagem feita pelo jornalista Waldair José de Souza para a edição especial do jornal "Tópico", em comemoração ao 15º aniversário de emancipação do Distrito (25/08/1958), Machadinho afirmou que a troca da placa, feita há exatamente 75 anos, foi uma forma de o povo reagir ao epíteto de "Meriti do Pavor". Atendendo à decisão do povo, o então interventor federal no antigo Estado do Rio de Janeiro, Dr. Plínio Casado, subscreveu a mudança de nome da estação ferroviária, através do Decreto Estadual nº. 2.559, de 14 de março de 1931. No Decreto-Lei nº. 1.055, de 31 de dezembro de 1943, desmembrando de Iguaçu os distritos de Caxias, São João de Meriti e Campos Elíseos e criando o Município de Duque de Caxias, o patronímico do "Patrono do Exército" foi mantido.


Legenda:
Por iniciativa de Machadinho, a Estação de Meriti foi rebatizada de Caxias, numa homenagem espontânea dos moradores do Distrito ao Patrono do Exército, que nascera na Fazenda São Paulo, no 3º Distrito

Coluna 144, publicada em "O MUNICIPAL", Edição Nº 9045 (21 A 28-10-2005, pg. 5)

CONCEPÇÃO: ALBERTO MARQUES E JOSUÉ CARDOSO. FOTO: ACERVO DO INSTITUTO HISTÓRICO VEREADOR THOMÉ SIQUEIRA BARRETO (CÂMARA MUNICIPAL DE DUQUE DE CAXIAS)

terça-feira, outubro 18, 2005

PORQUE ELE ERA “A ALEGRIA DO POVO”?(Coluna 143)

►Ele tinha tudo para ser mais um desvalido da sorte, como eram conhecidas as pessoas que não tinham futuro brilhante, nem fortuna em seu horizonte. Mulato, de pernas finas e tortas, arqueadas mesmo, de poucos estudos, sua única qualidade era a intimidade com a bola, que sabia controlar como poucos. Jogador do Glorioso, como os botafoguenses se referiam ao clube da estrela solitária, ele acabou sendo convocado como reserva de um ponta-direita que brilhava no Flamengo: Joel. Acabou caindo nas graças do técnico Feola e ganhou a posição. E logo os marcadores das melhores seleções do mundo foram rebatizados por um codinome, que se tornou motivo de gozações: “João”. Quem era escalado para marcar aquele moleque de pernas tortas já podia adivinhar o que diriam os jornais do dia seguinte: Ele venceu mais um “João”. Seu nome de “guerra”: Mané Garrincha.
Moleque, no sentido de ingenuidade e pureza de sentimentos, ele morava em Pau Grande, à época um distrito de Magé, e fazia questão de viajar nos trens de “Segunda” da Estrada de Ferro Leopoldina. Os amigos e vizinhos, faziam hora na entrada da Estação de Barão de Mauá, à espera do mais famoso morador do Distrito. Ao chegar, sempre sorridente, ele fazia questão de pagar as passagens do grupo, que, literalmente, “tomava de assalto” um dos vagões destinados aos passageiros da Segunda Classe dos trens que faziam a ligação Rio-Teresópolis, com parada obrigatória na Estação de Pau Grande.
Ele roubou a cena numa reunião da Comissão Técnica da Seleção brasileira, antes do jogo com a forte equipe da União Soviética, onde o técnico Feola explicava uma das jogadas que resultaria, segundo o bonachão treinador da Seleção de 1958, num gol para a seleção canarinho. Dada a saída pelo goleiro Gilmar, a bola iria de pé-em-pé até o gol adversário. Seria moleza, tal e qual a antológica jogada da seleção canarinho no jogo contra o Chile em que, depois de roubar a bola do adversário ao lado da grande área brasileira, em exatos 17 segundos ela saiu dos pés de Juan para chegar ao gol do Chile, num chute mortal de Robinho.
Na época, tudo era explicado num quadro-negro e, ao final da exposição de Feola, com a sinceridade e a simplicidade, que eram marcas pessoais de seu comportamento, Garrinha indagou: “Já combinaram isso com os “inimigos”?.
Esse era o Mané Garrincha que fazia a alegria do povo. Mas havia um outro Garrincha, que não ligava para o dinheiro e que, por amor à bola, fazia qualquer sacrifício. Como ficar fazendo embaixadas na porta de uma loja de departamentos, na calçada da Av. Presidente Kennedy, em troca de alguns trocados. Era o mês de maio e o Forte Tupynambá, uma loja de material esportivo situada ao lado do estratégico Bar Elite, aproveitava a ocasião para acelerar as vendas com as suas tradicionais “Loucuras de Maio”.
A campanha promocional era organizada pela Agência OPP-Organização Poubel de Propaganda, da dupla Zoelzer e Ruyter Poubel, dirigida pelo publicitário Genival Rodrigues. Já que o cliente era especializado em material esportivo, nada melhor para fazer a propaganda, numa época em que a televisão ainda engatinhava por aqui, do que usar uma figura carismática como Garrincha, fazendo embaixadinhas na porta da loja. E a idéia deu certo e muita gente se aglomerava, todas as tardes, quando não havia jogo do Botafogo, em frente à loja para ver Garrincha demonstrar a sua paixão pela “pelota”, pela “gorduchinha”. E a estratégia publicitária dava certo e muitos dos que se encantavam com a habilidade de Garrincha, acabavam entrando na loja para comprar alguma coisa. Realmente, com a bola nos pés, aquele menino-homem, de pernas tortas e sorriso fácil, fazia verdadeiramente a “Alegria do Povo”!

(Coluna nº 143, publicada em "O MUNICIPAL", Edição Nº 9043 (14 A 21-10-2005, pg. 5).
CONCEPÇÃO: ALBERTO MARQUES E JOSUÉ CARDOSO. REPRODUÇÃO: CAPA DO CORDEL ‘GARRINCHA, A ALEGRIA DO POVO”, DE BARBOZA LEITE